No cenário de lutas femininas,só para citar um tópico, vivemos até pouco tempo em uma época em que , na publicidade e na
vida - ter cachos - por exemplo , não era de forma alguma uma vantagem , sequer um modo de ser ; a menos que se quisesse
passar despercebida. Além disso, perder
todos os dias um tempo enorme tentando domar esses cachos para , ao
menos, parecer “aceitável” e , portanto, “integrada” à sociedade , era muito
dispendioso.E horrível.E injusto. Mas esperar uma reação contrária de uma
adolescente , por exemplo,vitimada por todas essas ideias distorcidas de beleza e de sucesso, veiculadas na subliminaridade da mídia , realmente, seria pedir demais.
Sem esquecer o movimento feminista e suas conquistas ,
porém acrescentando dados relevantes ; no século passado , a invenção da pílula e da
máquina de lavar elétrica
consubstanciaram-se
ao
movimento libertário da mulher que pareceu então assentado , faltando aparentemente ao feminino , agora , “evoluir” a partir de então, embora muitas de nós - se não ainda a maioria - apesar de ter
recebido esta pequena alforria , siga
autoflagelando-se dentro desse arcaico inconsciente coletivo patriarcal.
Porém, reivindico ainda
uma sequência lógico-evolutiva , agregada ao movimento
feminista , passando pelo quadrinômio: pílula-máquina
de lavar –internet-chapinha . É......chapinha !!
Aparentemente grotesco
ou irrelevante, numa primeira vista não parece nem um pouco digno reduzir o movimento feminista e as conquistas
femininas a um quadrinômio como o mencionado , entretanto, com a pílula libertamos não apenas nosso corpo e nosso prazer ,
mas
também nossa mente , tornando o fato de
ser mãe uma opção e não mais uma obrigação ; com a máquina de lavar, ganhamos o ócio produtivo , também investido nos estudos; e agora , estamos vivendo ,supostamente ainda ,
no limiar desses dois movimentos finais do quadrinômio : internet-chapinha.
A internet , livre e por
definição democrática, abriu as
fronteiras do pensamento , da ação e, consequentemente , propiciou novas formas de pensar , de agir , de se estar
no mundo , de se encontrar iguais,formando subjetividades mais livres e menos
sujeitas às investidas de um padrão midiático único e pré-formatado . Ter cachos , agora é - de
fato –mais uma opção para as mulheres , embora não necessariamente
assimilada pelos homens até há pouco,também vitimados pela mídia em questão.
À esta altura , você
deve estar se perguntando: “mas onde entra o raio da chapinha?” Ora,na cabeça! Mas não apenas nos cabelos... Se a possibilidade
de assumir os cachos conseguiu libertar
a mulher de certos padrões , a chapinha
igualou de certa forma as mulheres sob
certos aspectos, e entre iguais , a competição tende a ficar menos agressiva . No
mundo animal – do qual ainda fazemos parte, ao que tudo indica - em cada espécie , há um padrão de
E assim parece ocorrer
com todos os animais: um se mostra e o
outro se sentirá particularmente afetado
por este visual a ser mostrado. Nos
seres humanos , o homem é que será atraído(e escravizado) pelo visual e, portanto,isso parece fazer com que a mulher,de um modo geral, busque naturalmente se enfeitar.
Desta feita, se antes, culturalmente,a mídia dava
prerrogativas gritantes à mulher de cabelos lisos, agora, com a internet desbancando a mídia
seletiva e democratizando conceitos , e a chapinha igualando visualmente as mulheres , tornando o
visual “liso” apenas uma decisão
momentânea e reversível - assim como ter
cachos - oferecida a qualquer mulher ; refaz-se
assim um jogo de forças - antes tendencioso – que aprisionava a mulher
dentro de um estereótipo , afetando inclusive as corajosas que tentavam
resistir ao modelo feminino padrão.
Há quem diga que a
chapinha apenas estabelece o estereótipo
“liso” , confirmando-o , reforçando-o. Até certo ponto , concordo. O que
ninguém imaginou é que haveria desdobramentos outros , um ciclo evolutivo
libertário sem precedentes , escondido num reles equipamento de beleza ou , respeitando-se a cronologia dos acontecimentos,no quadrinômio
: pílula - máquina de lavar –internet - chapinha.
Pois é, não é nem um
pouco glamoroso. Às vezes as revoluções/evoluções acontecem assim, beirando o
ridículo e com desdobramentos
inesperados. Mas era o que tinha para ontem , hoje e, ao que tudo indica , continuará
ocorrendo.
Mary Lúcia Oliveira.