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Colunista:

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sexta-feira, 13 de novembro de 2015

Literatura - O Imponderável, o Real e o “Face” !






Reflexo de tempos “facebookianos”  e “selfiecescos”, estaria a literatura contaminada pela sociedade imediatista – hedonista – voyerista -  ou seria apenas vida, tecnologia e arte que seguem , juntas, construindo nossa identidade cultural, ressignificando padrões estéticos e comportamentais?
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                                                                   https://sociotramas.wordpress.com/2015/04/21/a-intertextualidade-em-obras-de-arte/                     


Temos uma necessidade  cartesiana de  nomear, qualificar, detalhar  e  medir o imensurável. Em literatura não é diferente, necessitamos demarcar no tempo as ocorrências literárias, por mais problemática que seja tal periodização no estudo desta . Quando professora, por exemplo, sempre fora   complicado explicar a meus alunos o período literário em que estaríamos inseridos. 

Desenhos : Pawel Kuczynski

Brincávamos que estávamos no período “facebookiano/selfiecesco/ultramoderno”. 
É bastante difícil opinar acerca daquilo que ainda se está vivendo, correndo-se o risco da parcialidade. Os historiadores, em geral, preferem denominar os períodos a partir de 30 anos após a época em que foram produzidos os textos ; daí a dificuldade natural de nomear um período enquanto se está nele. Igualmente complicado é saber a quantas andam as tendências atuais na literatura...  ... e na sociedade.


Desenhos : Pawel Kuczynski


Li recentemente uma matéria bastante interessante (perdoem-me...já não me recordo mais da fonte) acerca das tendências literárias no cenário brasileiro e global. Nesta, vários especialistas opinaram, chamando-me a atenção um enfoque baseado no livro : Contingência, ironia e solidariedade, de Richard Rorty, em que o autor fala de hermetismo e engajamento, partindo da premissa de que existem dois tipos de linguagem literária (linguagem transparente e linguagem complexa) e dois tipos de conteúdo literário (conteúdo subjetivo e conteúdo político);  sendo que livros de conteúdo subjetivo seriam os imersos na mente do sujeito e os  de conteúdo político aqueles  que tratam das questões sociais.

Segundo esta matéria  , já se poderia dizer que a tendência quase  dominante  hoje na literatura seria  a dos livros , tanto em prosa quanto em verso, de linguagem transparente e conteúdo subjetivo.

Traduzindo: livros que abordam a experiência cotidiana do autor, fazendo assim ,da crônica , o gênero literário do momento, dado  seu caráter realístico ,  podendo desdobrar-se em conto-crônica, em poema-crônica e até em romance-crônica ; além dos contos e romances autoficcionais , levando-se  em conta a verdade biográfica do ficcionista -  vista como um valor de autenticidade ,de natureza confessional,   autobiográfica, passando para o leitor a ideia de que ele esteja mergulhado  numa história verdadeira;  na vida real de uma pessoa de carne e osso - esquecendo-se o leitor , por vezes, de que estaria lendo um livro, podendo , inclusive , submergir numa ilusão compartilhada com o autor de que  o protagonista viesse a ser esse próprio autor. 

Esta tendência ou necessidade que algumas pessoas (hoje, aparentemente a maioria) têm de experienciar  o real , parece fazer  com que o leitor tenha  um esquecimento   momentâneo  de que esteja lendo um texto e sim  bisbilhotando , mergulhando na vida “real” de alguém, como ocorre nas redes sociais.





Fonte da imagem:


http://lounge.obviousmag.org/ligia_boareto/2015/05/24/facebook-curtir-e-nao-curtir.jpg

Desenhos : Pawel Kuczynski

 Presumivelmente , este apreço - por vezes  ingênuo - pela “realidade/verdade” é que estaria “salvando da falência a literatura brasileira”, bastando para tanto , segundo a matéria, vermos a lista de vencedores dos principais prêmios literários dos últimos  anos,  retrato dessa aparente tendência.

Já na poética, hoje, o verso que parece interessar não é aquele repleto de regras e cânones do passado. Agora , a poesia lida , em sua maioria, parece estar  sem grandes pretensões acadêmicas, sem firulas  elitisantes ,visto que não esteja sendo lida apenas por poetas , acadêmicos ou pesquisadores, mas sim, por  quem se interessa pela    existência cotidiana , acessível,  bem-humorada ,que pode ser “curtida” e comentada nas  redes sociais(porque entendida )  . O eu lírico parece ter cedido  lugar  à conversa descontraída, sem grandes explicações, bibliografias  ou notas de rodapé.  
  
Parece, enfim, haver um interesse exacerbado pela verdade do real, do aqui e agora , aproximando-se de uma simplicidade que - aparentemente -  beiraria o simplório ; com as devidas  escusas à redundância.


Mas,de onde viria esta aparente tendência de experimentação do simples,do agora ,do "real"  ?

Um desavisado imediatista diria logo que se trata de mais uma consequência de uma educação ruim. Será ? 

Explicações imediatistas geralmente não se sustentam ou , pelo menos , necessitam de algo mais para  tornarem-se  minimamente coerentes . Assim, como quase que por associação, lembrei-me do "mundo líquido” de Bauman  , e algo , do alto de meu “achômetro”, começou a fazer sentido . 

No mundo ”líquido” de Bauman (Zygmunt Bauman, sociólogo polonês), no qual os relacionamentos hoje seriam  massivamente  virtuais , pouco reais  e sem uma duração consistente ;  talvez  o indivíduo seja levado – pela própria ausência do tangível -    a uma busca de algo mais concreto a que  , provavelmente , a literatura realística de  fatos cotidianos (ainda que forjados por um exímio autor-protagonista-testemunha )  esteja suprindo .

As cenas corriqueiras , presentes no” facebook” , “instagram” e redes sociais diversas -  no geral  triviais e predominantemente fúteis-  imitam o cotidiano mas com uma roupagem maquiada de “glamour”,   gerando uma falsa interação que , apesar de importante , não  faz com que tais cenas tenham o “status” de verdade  da “realidade/simulacro”   desta  literatura que emerge. 



Estaríamos regredindo literariamente ? 
Ainda não sei dizer e talvez não venha saber... não nos próximos trinta anos... 

Mas penso que algo parecido possa ter ocorrido com os artistas dos idos da  “Semana de Arte Moderna de 22” , por exemplo, quando grandes literatos  da época  criticaram ferozmente os arroubos antropofágicos desses artistas e escritores que – igualmente  na contramão do que estava posto como certo e “ normal” , fugindo completamente dos padrões tradicionais  que influenciavam os artistas até então - modificaram  não só a estética e a literatura  como principiaram uma renovação de  costumes.   

Provavelmente, o “Abapuru” de ontem, possa ter assustado tanto quanto os versos livres e descompromissados de hoje...
  Lobatos que o digam !

http://www.estudioaliento.com.br/attachments/Image/livros_mouse.jpg




Mary  Lúcia  Oliveira

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